segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Gerrit Gielen - "Buracos negros dentro de nós"



Muitas pessoas constantemente se bombardeiam com pensamentos negativos: “Não posso fazer isto, isto não é para mim, sou fraco, preciso me esconder porque sou muito mau, o mundo não é um lugar seguro, isto provavelmente vai dar errado…” e assim por diante.

Como acontece isso? Por que fazemos isso?

O motivo desse comportamento autodestrutivo é que todos nós, em algum momento desta vida ou de vidas passadas, fomos traumatizados. Traumas são experiências negativas tão intensas que nossa personalidade não consegue lidar com elas; uma parte da nossa consciência se “congela” e fica presa no tempo.

Tomemos como exemplo alguém que, numa vida passada, vivenciou a ocupação do seu país durante uma guerra. Pessoas eram pegas nas ruas e, de repente, desapareciam; havia a constante ameaça de violência e não se podia sentir-se seguro em nenhum lugar.

A personalidade dessa vida passada sofreu intensamente um medo avassalador e não conseguiu lidar com essa situação pelo resto da sua vida.

Uma parte dessa pessoa foi traumatizada e ficou presa no tempo, presa na realidade da guerra e continua enviando mensagens à personalidade atual como se ainda estivesse na guerra: “A vida é perigosa, há muita violência ‘lá fora’, não se pode confiar nas pessoas, você é impotente.”

A personalidade atual não percebe que esses pensamentos persistentes estão relacionados com uma realidade muito diferente; ela simplesmente acredita nas mensagens e se acostuma a enxergar a vida através dos olhos da personalidade traumatizada daquela vida passada.

Desconhecidos são vistos com desconfiança, há sempre um mau pressentimento, um medo de violência e a crença de que é melhor se trancar em casa porque, se sair, é possível que não volte nunca mais.

O TRAUMA FUNCIONA COMO UM BURACO NEGRO

Nossa parte traumatizada é a maior fonte dos medos que sofremos. Observe que o medo sempre nos diz que existe alguma coisa lá fora que é perigosa, hostil e prejudicial. O medo nos faz focalizar o mundo externo como fonte de nossos problemas, e não o próprio trauma.

Se você tiver pavor de cachorros e estiver no mesmo ambiente que um cachorro, toda sua consciência estará concentrada nesse animal, excluindo tudo o mais que lá houver. Mas, na maioria das vezes, o cachorro não é o problema; a verdadeira questão é o seu medo de cachorro. Se continuar focalizando o que está fora de você, sua percepção ficará distorcida.

Seu foco está sempre naquilo que lhe dá medo e, assim, você tende a vê-lo em todo lugar; seu medo exagera o perigo real e você perde muita energia evitando-o. Este padrão reativo cria um círculo vicioso; o medo reduz a sua percepção da realidade de tal modo, que ela parece confirmar e justificar ainda mais os seus medos.

Ao ler o jornal, sua atenção é automaticamente atraída para as notícias sobre cães que atacaram pessoas ou que transmitem doenças infecciosas. Ao caminhar pelas ruas, os cachorros parecem olhar para você de forma ameaçadora, prontos para atacá-lo.

Este círculo vicioso mantém sua parte traumatizada presa e essa parte sua não consegue se libertar enquanto esse círculo não é quebrado. Uma parte traumatizada da personalidade, presa num círculo vicioso, pode ser vista como um buraco negro dentro de nós. Ela suga energia, ela suga a luz e nos leva de volta ao passado, a momentos no tempo em que nossa consciência ficou congelada e presa.

Eu mesmo tenho um medo inato de viajar. Quando viajei para a França neste verão, eu sentia constantemente que o carro poderia quebrar e via sinais disso em tudo. Pouco antes de partirmos, o cinto da minha calça quebrou – “Mau sinal”, pensei.

Na estrada eu notava carros quebrados por todo lado. Quando paramos para descansar num estacionamento, eu pensei ter visto vestígios de óleo atrás do nosso carro. No painel do carro, apareceu uma mensagem dizendo para irmos a um posto trocar o óleo da caixa de câmbio (depois descobrimos que isso foi um erro do computador do painel).

Em outro momento, reparei numas ferramentas na parte de trás do automóvel, o que me fez achar que era sinal de que ele precisava de conserto. E assim por diante…

Durante a viagem, decidi voltar-me para o meu interior, para o meu buraco negro. Lá eu vi um homem deitado à beira de uma estrada, mas só podia enxergar suas costas. Ao me aproximar dele, fiquei chocado; vi que ele tinha sido apunhalado no rosto e nos olhos. Ele estava longe de sua casa, e as pessoas dali não tinham confiado nele e fizeram isso com ele. O homem morreu pensando no seu lar e desejando nunca tê-lo deixado.

No passado, eu raramente viajava e nem dirigia um automóvel. Pensava que tinha muitas boas razões para esse comportamento, mas não tinha consciência do buraco negro dentro de mim. Agora, viajo constantemente e muitas viagens que fazemos me trazem grande alegria. Por todo o mundo, temos encontros maravilhosos com pessoas que pensam como nós e gostamos de visitar lugares bonitos na natureza.

É praticamente impossível discutir com uma pessoa que esteja num buraco negro, isto é, que tenha uma percepção estreita e baseada no medo de determinada questão. Se você tentar, ela imediatamente lhe apontará inúmeros “fatos” e razões que sustentam sua visão do mundo. Ela se recusa a se abrir para a possibilidade de que seu próprio medo – e não o mundo exterior – seja o verdadeiro problema.

Está convencida de que seu medo é causado por ameaças verdadeiras do mundo externo e, portanto, é razoável e justificado. Se você não concordar com ela, poderá ter que ouvir que é você que está sendo ingênuo, recusando-se a ver os fatos óbvios que estão bem diante do seu nariz.

Quanto maior o medo, mais rígidas e firmes são as crenças. Muitos sites da internet, que estão cheios de previsões sinistras e teorias de conspiração, originam-se de buracos negros no nível interno.

Buracos negros podem tornar-se tão poderosos, que sugam e assumem toda a personalidade; em tais casos, manifesta-se a paranoia (desconfiança extrema). Tudo que as pessoas falam ou fazem é interpretado de modo negativo, de modo que a comunicação normal se torna impossível.

Ameaças e conspirações são percebidas por todo lado. Amigos e familiares que tentam quebrar o encanto dessas obsessões são vistos com se estivessem sob a influência de forças maléficas. A personalidade paranoica torna-se completamente isolada e aprisionada dentro da sua própria mente.

Até certo ponto, todos nós sofremos de paranoia. Quase todos nós temos algum buraco negro interno, relacionado com uma questão em particular, que distorce nossa percepção e nosso relacionamento com outras pessoas.

O QUE VOCÊ PODE FAZER?

1. Perceba que existe um buraco negro dentro de você.

O primeiro passo – e o mais importante – é reconhecer que uma parte de você foi traumatizada e está lhe enviando mensagens que não são corretas. Sempre que perceber que seus pensamentos são particularmente negativos, ou sempre que se sentir exageradamente amedrontado com alguma coisa e esperar pelo pior, esteja preparado para voltar-se para o interior de si mesmo, para o buraco negro, e encarar a parte traumatizada.

Faça a si mesmo as seguintes perguntas: “Será que existe um buraco negro dentro de mim? Será que existe uma parte traumatizada de mim que distorce toda a minha visão da realidade? Uma parte que me fecha a todas as coisas boas e positivas que acontecem à minha volta? A minha visão da realidade e atitude para com as pessoas são baseadas no medo ou no amor?”

2. Entre no buraco negro.

Entre no buraco negro, não para sofrer, mas para levar luz e amor a essa sua parte. Faça uma imagem dessa parte traumatizada. Imagine, por exemplo, que ela é uma criança perdida e perceba que ela precisa de muito amor e carinho. Conecte-se com essa criança, fite-a nos olhos e sinta o que é necessário para que ela libere gradualmente o medo.

Toda vez que se pegar abrigando pensamentos negativos, sentimentos sombrios ou medos irracionais a respeito da vida, das pessoas ou da sociedade, tome coragem e vá para dentro de si mesmo. Procure o buraco negro no seu interior – a prisão da parte traumatizada. Esteja presente como um anjo amoroso, levando conforto, confiança, tranquilidade e luz.

3. Diga a verdade a si mesmo.

O Evangelho de João diz: “A verdade vos libertará.” Palavras que são verdadeiras carregam um poder imenso. A verdade tem origem no amor e não no medo. Sinta o amor disponível no universo; sinta o amor da mãe Terra pela humanidade; sinta o amor dentro de você mesmo e aproxime-se da sua parte traumatizada a partir desse amor. A partir dessa fonte, formule algumas sentenças curtas e repita-as frequentemente em voz alta.

Por exemplo:

- A vida é boa para mim.
- A Terra ama a humanidade e nos ajuda.
- A humanidade está despertando e tornando-se mais consciente da sua unidade; esta unidade está começando a se manifestar em todos os lugares.

Verbalizar este tipo de mensagem verdadeira é um instrumento poderoso quando se deseja abandonar pensamentos baseados no medo.

Hoje em dia existe muita literatura sobre “pensamento positivo”. As pessoas se postam diante do espelho e começam a repetir afirmações positivas para si mesmas. Isto só faz sentido se essas mensagens forem verdadeiras; e elas são verdadeiras quando são baseadas no amor.

Alguém pode repetir para si mesmo: “Sou rico, sou rico!”, na esperança de que a realidade se ponha de acordo com sua intenção. Mas será que essa afirmação é baseada no amor? Ou no medo da carência, no medo de que o universo não tome conta dele? Se este for o caso, a afirmação não funcionará.

Antes de começar a repetir afirmações incessantemente, volte à fonte. Conecte-se com o amor no fundo do seu coração e veja que mensagens vêm à tona. Comece por amar a si mesmo e acolher sua parte traumatizada. Afirmações baseadas no medo não funcionam.

Se a afirmação for correta, não é realmente essencial que você a repita com frequência.

Já lhe aconteceu de alguém lhe dizer alguma coisa que calou fundo em você, que lhe soou como uma verdade profunda? Foi necessário ficar repetindo essa mensagem o tempo todo? Provavelmente não.

Se uma sentença é dita em voz alta com a intensidade correta, não é preciso repeti-la tantas vezes. Uma vez por dia é o suficiente.

Entretanto, o primeiro e mais importante passo, neste processo de três etapas, é encarar honestamente o buraco negro em seu interior. Assim que perceber que o medo está distorcendo sua percepção, você poderá começar a acolher esse medo com amor, e a partir desse amor, encontrar afirmações que sejam verdadeiras e eficazes.


Autor: Gerrit Gielen
Fonte secundária: De Coração a Coração

Tradução: Vera Corrêa - veracorrea46@ig.com.br